![]() |
Foto: Rosinei Coutinho/STF, Gustavo Moreno/STF, Luiz Silveira/STF e Victor Piemonte/STF |
O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso da trama
golpista na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), votou pela
condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e dos outros sete réus. Em seu
voto, Moraes afirmou que todos os acusados agiram em conjunto e cometeram
cinco crimes: liderança de organização criminosa, tentativa de
abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano
contra o patrimônio da União, e deterioração de patrimônio tombado.
O julgamento será retomado ainda nesta terça-feira, 9, com o
voto do ministro Flávio Dino. Nos próximos dias, irão votar Luiz Fux, Cármen
Lúcia e Crisitano Zanin, o presidente da Turma. Há sessões reservadas para o
julgamento até sexta-feira, 12.
Ao votar pela condenação, Moraes não indicou a pena. A
dosimetria será decidida posteriormente caso as condenações sejam confirmadas.
Além do voto de Moraes, a primeira parte da sessão, que
durou mais de cinco horas, foi marcada por três pontos principais: a defesa,
pelo ministro relator, da validade da delação de Mauro Cid; interrupções e
reclamações do ministro Luiz Fux; e a exposição detalhada de Moraes, respaldada
por um powerpoint, que apontou Bolsonaro como líder da organização
criminosa e afirmou não haver dúvidas sobre a existência da tentativa de golpe
de Estado.
O voto de Moraes
Moraes iniciou seu voto fazendo um paralelo com a ditadura
militar para demonstrar como Bolsonaro e seus aliados atentaram contra o Estado
Democrático de Direito. O relator citou o fechamento do Congresso Nacional após
1964, a edição do Ato Institucional nº 2 -- que estabeleceu eleições indiretas
para Presidente -- e a suspensão da garantia do habeas corpus como marcos
autoritários do período, estabelecendo um comparativo com a sequência de atos
promovidos pelo grupo bolsonarista entre julho de 2021 e 8 de janeiro de 2023.
Em seguida, Moraes defendeu a validade da delação premiada
de Mauro Cid, afastando alegações de nulidade apresentadas pelos advogados dos
réus. Ele ressaltou que a colaboração foi regular e voluntária, com a própria
defesa do delator reafirmando sua leitimidade.
"Os depoimentos posteriores foram regulares,
necessários, segundo a Polícia Federal, para aprofundar investigações. Beira a
litigância de má-fé dizer que os oito primeiros depoimentos foram oito delações
contraditórias", afirmou o relator.
O ministro ainda apontou que a Justiça Eleitoral era tida
como "o inimigo a ser derrotado" pelos acusados. Afirmou que
Bolsonaro, enquanto líder da organização criminosa, intencionalmente fomentou
informações falsas sobre o sistema eleitoral para provocar uma revolta popular
em caso de derrota. Moraes chamou de “patrimônio nacional” e motivo de “orgulho
nacional” o voto eletrônico. E afirmou que, por esse motivo, havia uma
“narrativa mentirosa” para tentar desacreditar o sistema eleitoral eletrônico.
Além disso, como prova da intenção de cometer um golpe de
Estado, o magistrado relembrou uma declaração do ex-presidente, em que
Bolsonaro afirmou: "Eu tenho três alternativas para o meu futuro: estar
preso, estar morto ou a vitória". E classificou o 8 de janeiro como ápice
do plano golpista, destacando que tentativa de golpe "já consuma um
crime".
“Não existe na história da humanidade um golpe em que os
golpistas se colocam no banco dos réus”, afirmou Moraes, acrescentando que
se a trama fosse bem sucedida, seriam o STF e outras instituições democráticas
que estariam no banco dos réus.
O ministro detalhou como a estratégia golpista incluiu a
utilização ilegal de órgãos públicos, como a Agência Brasileira de Inteligência
(Abin), que, segundo ele, foi convertida em uma central de contrainteligência
para disseminar narrativas falsas. Sobre as anotações golpistas na agenda do
general Augusto Heleno, questionou: "Como alguém pode achar normal numa
democracia, em pleno século 21, uma agenda golpista?".
O ministro também destacou episódios como os bloqueios da
PRF no segundo turno das eleições -- que classificou como ato de "absurdo
e desespero" -- e a reunião ministerial de 2022, onde integrantes do
governo discutiram abertamente ataques às urnas e planos para manter Bolsonaro
no poder.
"Nós estamos esquecendo aos poucos que Brasil quase
volta a uma ditadura, que durou 20 anos, porque uma organização criminosa,
liderada por Jair Bolsonaro, não sabe perder as eleições. [...] Tivemos 20 anos
de torturas, desrespeito ao Judiciário. As pessoas sumiam, eram mortas, não é
possível banalizar esse retorno a esses momentos obscuros da história", disse
o ministro.
Ao ler as ameaças ao STF proferidas por Bolsonaro em 7 de
setembro de 2021, Moraes elevou o tom de voz e afirmou, com indignação:
"Qualquer estudante de primeiro ano de Direito vai caracterizar o que
aconteceu como grave ameaça". Essa fala foi uma resposta direta à tese da
defesa de que não houve ameaça concreta à democracia.
Além disso, recorreu a uma comparação com a facção
criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) para dimensionar a gravidade das
mensagens trocadas entre o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) -- então
diretor da Abin no governo Bolsonaro -- e o ex-presidente.
“Isso não é uma mensagem de um delinquente do PCC
para outro. Isso é uma mensagem do então diretor da Abin para o presidente
da República”, disse Moraes sobre a conduta dos réus, após a leitura de
mensagens interceptadas pela Polícia Federal.
Com informações do Terra